terça-feira, setembro 23, 2008

(baseado em amós, em rachel e no passado)

há dois anos eu escrevia sobre leões, sobre desencontros, sobre perdão, morte e falhas. em dois anos tu se mudou, tu casou, tu teve filho, tu sumiu, tu trabalhou, tu chorou, tu espalhou cacos de vidro pelas calçadas, tu aprendeu que fumaça pode ser bonito, tu fez tua vida. tu pegou fogo, explodiu e virou oceano de novo.

faz dois anos eu penso sobre leões, sobre desencontros e encontros, sobre nem ter de pedir perdão

sobre morte, metaforicamente(émelhorquandovembemrápidoeempequenasdoses)

sobre falhas, sempre.

eu acho que, enquanto leio, penso e escrevo romances, você vive um.




(baseado em amós, em rachel e no passado)

domingo, setembro 21, 2008

sunday song

The madness came like it always does – nobody saw, nobody cared
‘Cause it’s all about the place that you’re at

Lie alone, all thoughts unfold about the person you should be
by the time you reach the age of eighteen it never seems
like anything’s wrong, so don’t be afraid…

Don’t get caught up – be the person and the people that you love, all your life

domingo. 15h36. ah...

domingo sempre foi um dia ruim. é um sentimento parte do cosmos. é lei internacional. é um sentimento universal. por que nunca chove no domingo? pelo contrário. domingo é um dia tão aberto e você só quer escurecer mais e mais.

domingo é um dia muito ruim. no entanto, abra as janelas do carro. as duas. até o fim. sem medo de motoqueiro ou de parar no sinal. sinta o vento. observe como a luz do sol é mais clara no domingo. aproveite para ver melhor as cores das calçadas, dos muros, das pontes, do rosto das pessoas, das roupas dos domingos. aproveite, quando passar pelo parque, para ver o verde, em vez do azul. sinta o cheiro de folhas balançando pelo vento. aumente o volume do som, sem esquecer das janelas abertas. quando estiver naquela estrada retilínea e sem sinais, lembre-se de que na segunda-feira nao será possível ouvir música alto e de janelas abertas, por isso faça ondinhas no vento. ou brinque de tapa-vento, como aprendeu com seu pai. veja o rosto dos pedestres. é domingo e todos têm o ar relaxado. esquece o sábado, esquece a sexta. esquece seus pensamentos. aproveita o domingo. deixa a dorzinha se recolher, deixa a claridade vir. não precisa sorrir nem precisa ficar feliz. mas aproveita sua solidão, caminha ao seu próprio lado, e não esquece que, mesmo quando todos se forem, mesmo que vá sentir tantas dores, ainda haverá você.

terça-feira, setembro 09, 2008

terça feira seis e meia da manhã

Saiu, ainda de pijama, porque não aguentava mais ouvir o gato chorar. Ela lhe fazia carinho e nada era suficiente. O gato pedia para abrir a porta, ela abria, ele chorava. Ela o convidava pra dentro, ele entrava e começava a chorar. Foi ao vizinho e chorou, o que a deixou brava. Além do ciúmes louco que tinha desse gato, tinha medo que ele acordasse os outros. Perguntou-lhe o que ele tinha. Ele chorou. Tá sentindo alguma dor? Ele chorou. Como que não aguentasse mais os lamentos do gato carente, pôs o chinelo por cima da meia e saiu em meio a neblina.
seis, sete da manhã.
passou em frente a uma escola e viu as crianças asseadas. Camisa de manga longa branca, gravatinha. As meninas, muito bem penteadas. O pai e a mãe de mãos dadas dão um beijo burocrático no menino. A empregada negra, mal vestida, dá um tchau emocionada para a menina. Parece ser o primeiro dia de aula. Que mês será hoje, pensou ela?
Lembrou do gato e pensou que ele devia refletir algo dela.
Depois lembrou Dele, a dizer que ela imaginava muito, que os gatos são mais simples nos seus sentimentos. Será que ele tem razão, pensou.
As vezes desejava secretamente que os dois gatos morressem, de uma vez, para não ter mais que lidar com isso.
sentiu vontade de contar para alguém que sonhara com o avô a noite toda, que ele a esperava dentro de um carro. E que ela esperava alguém entrar para que seguissem viagem. Vai ver fora porque pensara a noite, antes de dormir, em como seria difícil se o avô morresse.
Pensou em como a instituição Família era algo que lhe era distante. Lembrou das crianças asseadas. Da gravatinha do menino, que devia aperta-lo forte, tanto mais e tanto mais frio que o abraço da empregada gorda, que se emocionava. Era agosto. Não podia ser início de ano letivo. Provavelmente a "preta" (se convenceu de que a chamavam assim)se emocionasse toda vez que levava a menina a escola. "essa tem futuro". E se ela visse a menina agora, de pijamas e chinelo, fumando na frente de uma escola infantil porque não soube lidar com a emoção de um gato? o que seria?
a gente envelhece e fica cada vez mais sensível, disse um velho passando para o seu neto. O neto olhava pro céu, certamente muito novo pra entender o peso daquilo. O peso do tempo e do céu.
Ela sorriu, e seguiu o passo.